Estourando bolhas sociais: uma ideia simples

Conhecer pessoas novas é sempre bom pra dar um chacoalhão

Em Brasília, onde morei por muito tempo, pude observar um fenômeno curioso. Apesar dos 3 milhões de habitantes na cidade, existe uma frequente sensação de que só encontramos as mesmas pessoas em todos os lugares.

Por muito tempo achei que era algo que só acontecia por lá, “uma grande cidade de interior”, era como eu descrevia. Em cada bar, balada, evento, via sempre as mesmas carinhas carimbadas. Foi então que comecei a viajar e sair pela cidade de São Paulo, observando que em geral, as mesmas caras também eram vistas nos mesmos lugares, bem parecido com Brasília. Se ia num show, observava algumas pessoas e, quando menos esperava, as mesmas apareciam em outro bar, poucas horas depois, com alguns quilômetros de distância.

Depois de repetidas experiências como esta passei a entender que, pouco importa o tamanho da cidade, gente com gosto e comportamento similares tendem a frequentar os mesmos tipos de lugares, criando essa impressão de que não existe muita variedade. Alguém que frequenta shows de rock, tende a frequentar o mesmo conjunto de bares e festas.O exemplo das cidades é uma versão ampliada do que acontece em outras esferas bem menores da nossa vida. Em nosso meio profissional, podemos ver os mesmos personagens migrando entre empresas e interagindo entre si. Quase todo mundo já ouviu a frase “porque o mercado da nossa área é pequeno, todo mundo se conhece” e isso soa verdadeiro para nossa percepção viciada.

Os profissionais de tecnologia tendem a se esbarrar em clientes, eventos e reuniões. A galera do marketing em festas e lançamentos, e os advogados bebem no mesmo bar. Não é que não existam outras pessoas, mas a forma como selecionamos nossos ambientes tendem a selecionar o mesmo grupo com elementos muito parecidos. O mesmo é verdadeiro na universidade, no futebol e em outras atividades que reúnem pessoas com um mesmo foco.

Aumentando o escopo

Quando pensamos sobre nossas bolhas sociais, uma pergunta inevitável acaba surgindo: como então podemos conhecer gente diferente? Como estourar a bolha dos grupos sociais e conectar-se com  quem que não pertencem ao nosso tradicional círculo de interesse?

A resposta que encontrei, por incrível que pareça, tem sido apresentar amigos que não se conhecem, mesmo que aparentemente não tenham nada em comum.

Recentemente fui adicionado a um grupo com 5 outros membros. Todos com perfil muito diferente do meu e com interesses que se dificilmente se conectariam. Quem me adicionou só queria que eu participasse de uma conversa divertida, não foi uma decisão por afinidade de interesses. A interação entre pessoas que não se conheciam mas estavam dispostas a conversar abertamente sobre assuntos diversos, transformou-se num curioso portal para uma novas perspectivas. As conversas sobre os vários links que são compartilhados no grupo sempre trazem um horizonte novo, raramente uma posição à qual esteja familiarizado.

Ao ler as interações entre os membros do grupo, fica evidente o abismo entre nossas opiniões e pontos de vistas. É assustador encontrar opiniões que nunca imaginei que pudessem existir e, mesmo quando não concordo, me sinto bem por ser confrontado com ideias tão divergentes.

A dinâmica do grupo não acontece sozinha, o criador do grupo faz questão de publicar notícias, artigos e informações questionando os membros sobre suas opiniões, gerando a faísca necessária para que a discussão surja. Gente tão diferente dificilmente irá interagir entre si sem algum incentivo.

Mas o exemplo acima não é o único, meses atrás fui adicionado em outro grupo - agora no Whatsapp - quase com a mesma característica, amigos de um grupo me colocando em contato com gente de outro perfil. Neste espaço não temos pretensão falar sobre temas sérios como no outro, mas ainda assim serviu para me colocar em contato com desconhecidos que jamais conheceria de outra forma.

Apresentar gente que não possui afinidade tem se mostrado uma excelente iniciativa. O modelo de internet repleto de bolhas sociais inevitavelmente transfere esse isolamento para o mundo real, tornando o ato de conhecer gente nova, bem distante das nossas bolhas uma tarefa quase impossível. Vale também enfatizar que os grupos que menciono são bem pequenos, e que dificilmente uma dinâmica tão bacana seria reproduzida num grupo muito maior.

* * *

Faz alguns anos escrevi um texto chamado “você é a média de pessoas com quem mais passa tempo”. Nele, explico um pouco da importância das pessoas que nos influenciam, mesmo que só com sua presença em nossas vidas. Todos os nossos amigos mais próximos - sem a mínima dúvida - possuem um papel crucial em nosso desenvolvimento, mas pessoas novas trazendo visões distintas são determinantes para evitarmos uma interpretação viciada do mundo.

A ideia de utilizar uma forma de tecnologia tão simples como criar grupos em redes sociais para ajudar nossos amigos - e sermos ajudados por eles - é sutil, mas muito importante. No entanto, vale lembrar que interações em grupo tendem a suprimir contatos mais individuais. Adotar a comunicação coletiva como única forma de contato, pode acabar causando o efeito inverso, transformando amizades que antes eram sólidas em contatos meramente superficiais. O caminho que parece fazer sentido adotar, é o do aprofundamento das conexões. Conhecendo expandindo o núcleo na medida que também cria laços mais fortes.

E você? Como faz para conhecer gente nova, pessoas diferentes que sejam capazes de adicionar valor a sua visão? Compartilhe suas ideias e nos ajude a enriquecer nosso papo.


publicado em 31 de Outubro de 2016, 19:19
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Alberto Brandão

É analista de sistemas, estudante de física e escritor colunista do Papo de Homem. Escreve sobre tudo o que acha interessante no Mnenyie, e também produz uma newsletter semanal, a Caos (Con)textual, com textos exclusivos e curadoria de conteúdo. Ficaria honrado em ser seu amigo no Facebook e conversar com você por email.


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